Cassiel
Porto era um homem de larga idade, levava uma triste e solitária vida. Sua casa
era pequena, pouco mobilada e solitária. Ele levava a vida na esperança da
reforma pois tinha 64 anos embora não o aparentasse por causa de seus olhos
tristes e rugas vincadíssimas.
Então
chegara mais um dia naquela sua enfastiante vida mas ele acordara com um
pássaro cantando dentro de seu quarto. – Mas que raio?
Afugentou
o seu pássaro, pois que ele o tornara seu dono, mas ele se recusou a partir.
Pousou sob seu ombro e cantou a seu ouvido uma melancolia soturna, uma ode à
vida e à morte, uma antítese paradoxal. – Mas que raio?
Então
como se nada fosse continuou seu dia mas sempre com o incómodo de seu pássaro
que apesar de não gostar se tornava habituado. Aquele incómodo era bastante
peculiar e atraia a atenção dos transeuntes que na rua indiscretamente olhavam,
alguns riam outros comentavam mas a nenhum escapara aquele pormenor. O pássaro
cantava agora feliz abanando as asas, esbracejando diriam alguns, mas a sua
melodia tornara-se ainda mais sinistra. Cassiel quase que juraria que o pássaro
falava em alguma língua cantada que ainda não havia sido inventada. O vento que
se fazia sentir não abalava o pássaro que cantava feliz uma sinfonia sinistra
que começava aos ouvidos de Cassiel a zumbir. Apesar de haver mil e um pássaros
iguais a este que voavam livres pela rua ele não desistia de seu novo poiso
quente e confortável e o seu canto belo mas infeliz fazia-se notar tanto que os
moradores daquela rua abriam as janelas e olhavam com espanto e admiração à
procura da origem daquela triste melodia.
Depois
de uma curta viagem chegou ao seu trabalho mas o seu pássaro não fugia apesar
da situação claustrofóbica em que se encontrava. O vagão de piloto de uma
carruagem de metro abarrotada de controlos e maquinarias.
Todo
o seu dia havia sido cantado por um pássaro que não havia desejado a liberdade
mas sim infernizar ainda mais o inferno vivo de um mortal que não o desejava.
Então
durante a noite quando ele caíra na inactividade do sono profundo sonhou que o
pássaro, aquele belíssimo rouxinol azul, era o fantasma de sua querida Inês que
desaparecera de sua vida no dia em haviam ido à ópera ver uma sinistra ópera à
qual ele tinha ido vestida de azul e após a qual ela se negara a viver mais com
o seu amante.
Foi
durante essa mesma noite que o pássaro fugiu mas não sem antes lhe segredar ao
ouvido: eu amo-te. Ele acordou sobressaltado pois se apercebera da veracidade
de seu sonho e tentou irremediavelmente apanhar o seu pássaro que lhe fugiu por
entre os dedos e foi rua fora cantando desta vez uma melodia de amor
incompreendido.
De
manhã acordou e chorou sem razão a perda de seu incómodo. Levou todo o dia no
absorto pensamento de sua amada Inês. As suas saudades voltaram agora que já a
havia esquecido, trazidas por aquela nobre ave canora que cantava uma melodia
de tristeza e má sorte.
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